Outro dia me perguntaram como eu escolho o que pintar, o que me inspira. Pensei um bocado para responder. Eu não escolho os temas, eles acontecem.
Nos tempos de UFPr a professora Dulce Osinski nos fazia pensar como temática, produzir séries de estudos de um único assunto. Era trabalhoso, porque não era só desenhar. Tinha que justificar, se explicar, pensar e repensar aquela prática. Nesta época eu tinha minha filha pequena e aquela vida tumultuada de quem trabalha, estuda, tem casa e filhos. Não tinha feito a "tarefa" de fazer oito desenhos sobre o mesmo tema. Então, no caminho de ônibus da minha casa até a universidade eu fui desenhando, sentada com a prancheta no colo, sem muita ideia do que fazer. Comecei a fazer as árvores, só uma parte do tronco. Só o que se vê da janela do ônibus. Rápido, sem detalhes, sem galhos finos ou folhas. Sabem como é, eu ali, atrasada, desenhando nas paradas, rabiscando solto enquanto chacoalhava nas ruas curitibanas.
As árvores chegaram na aula, receberam a análise da professora e foram tema por muito, muito tempo. Confesso que gosto demais de desenhar as árvores. Começou por preguiça de pensar em outra coisa, e foi se tornando meu tema preferido. Em cada época elas representaram coisas bem diferentes. Já foram secas, floridas, com folhas ou só os galhos. Já foram gravura, desenho, pintura.
Eu descuido de mim mesma e estou ali olhando um galho interessante que passa de atravessado todo tordo para o outro lado da copa da árvore. Eu paro e observo, muitas vezes fotografo. E olhando estas fotografias produzi duas pinturas que estarão na exposição.
Eu gosto muito da luz que a gente percebe nos galhos, das cores que, quando eu descuido um minuto, tomam conta de todo o espaço, ganham forma e tridimensionalidade.
Pintar nem sempre é uma linha reta, uma tarefa fácil. Esta obra enroscou por mais de um ano no cavalete. Não saía, não ia. Fiz boa parte em duas tardes e depois ficou ali parada por meses e meses. Alguma coisa nela me incomodava e deixei quieto. (deixar pra lá um problema e fingir que ele não existe não é uma boa solução, mas ajuda a por num lugar que permita repensar sobre o assunto e retomar depois!)
Quando esta exposição foi se aproximando e eu com a ideia maluca que precisava de 45 obras para comemorar os 45 anos voltei a ela. Procurei a foto de base, lembrei do lugar, do cheiro, da sensação maravilhosa de estar ali naquela pousada na beira do bosque, bem no centro de Ouro Preto, juntinho com a minha filhota Beatriz.
Respirei fundo e repintei tudo!
Porque as vezes é isto que a gente precisa. Parar para pensar no que tem de bom naquela lembrança, naquela ideia. Estas árvores me trazem a sensação desta luta diária pra ver ao longe, das subidas e descidas que a vida dá, do medo de cair do barranco e da beleza da vista do alto. Que sempre existe muita coisa entre a gente e a beleza lá longe, no caso a pitoresca e barroca Ouro Preto.
Muitas vezes estamos tão preocupados no objetivo, que está longe, e não percebemos a beleza do caminho. E Ouro Preto com seus casarios e igrejas barrocas centenários se transformaram em manchas brancas, desfocadas entre o bosque e a serra ao longe. Porque parece que eu descuido e as árvores tomam conta do meu desenho, da minha temática, do meu mundo.
Por isto "Pé de planta, pede Arte"!
a exposição abre dia 29/09 e fica até dia 13/10 no hall do Centro Cultural Vera Schubert.
beijocas coloridas